21.6.07

| sarlo e seu tempo passado

| Em “Tiempo pasado”, Beatriz Sarlo critica o excesso de importância dada a testemunhos para a compreensão da história.

| “Quando a lenda vira fato, imprima-se a lenda.” A máxima, ironicamente cunhada por John Ford em “O homem que matou o facínora” (1962), vem sendo obedecida com toda diligência pela história, e é por isso que está no centro da mais nova discussão proposta pela pensadora argentina Beatriz Sarlo em seu recém-lançado “Tiempo pasado, cultura de la memoria y giro subjetivo - Una discusión”.

| Contemporânea e participante das transformações engendradas nos anos 60 e 70, Sarlo, quatro décadas depois, oferece um novo desafio: reconstruir o passado a partir de fatos, e não de lendas. Interromper o entendimento do testemunho como “ícone da Verdade”, como grafa à pág. 23 de seu livro. Escrever a história com eqüidade na valorização das fontes de informação. “Eu não confio mais na memória do que nas informações jornalísticas, nos programas políticos, nos livros”, afirma. “A memória, em geral, não expande as dimensões intelectuais de um período.”

| O foco de “Tiempo pasado” (ed. Siglo XXI, 168 págs., 25 pesos argentinos -cerca de R$ 18) está posto sobretudo na compreensão dos anos de ditadura na América Latina. Em como -na falta de provas materiais que atestassem os crimes militares- o depoimento em primeira pessoa terminou por se transformar, de recurso para busca da verdade, em algo inquestionável, “sagrado” e visto francamente como superior a qualquer outra maneira de obter informação.

| A autora não questiona a pertinência e o papel do testemunho para processos jurídicos e morais. O que debate é o porquê de a memória ter se tornado, nas sociedades contemporâneas, material sobre a qual recai maior dose de confiança. O porquê de o relato em primeira pessoa -relacionado à experiência vivida, seja diretamente aos fatos ou como vivência subseqüente- não estar submetido aos métodos de crítica, comparação e análise dedicados a outras fontes da história. “Não se pode prescindir do relato em primeira pessoa, mas tampouco se pode deixar de problematizá-lo. A idéia da verdade em si é um problema”, argumenta (pág. 163).

| Essa “cultura da memória” é questionada por Sarlo em outros aspectos, para além da falta de rigor metodológico que lhe acompanha: a subjetividade natural a que está sujeita; as influências externas que modificam ou pelo menos condicionam o que é “lembrado” pelos participantes diretos dos fatos. Por terem vivido a experiência da qual trata a investigação histórica, recebem uma espécie de salvo-conduto para suas afirmativas e provocam um “giro subjetivo” na compreensão do passado.

| Dessa maneira, a história passa a ser erigida por visões individuais, e não pelo acúmulo de dados provenientes de diversos registros e instâncias e que, por intensificar as possibilidades de compreensão do objeto em foco, o tornaria tanto mais complexo quanto completo. Cita Susan Sontag (pág. 26) para deixar clara a pulsão de seu livro: “É mais importante entender do que recordar, ainda que para entender seja necessário, também, recordar”.

| A pesquisadora apresenta sua preocupação quanto ao império do depoimento já na capa de “Tiempo pasado”. Nela, o cineasta iraniano Abbas Kiarostami olha pela nesga de uma porta quase fechada. Ao seu redor, as colinas de Teerã se erguem, altaneiras, aparentemente infinitas. Seu olhar, no entanto, alcança somente uma ínfima parte dessa vastidão: a porção que lhe é permitido vislumbrar pelo vão de uma porta que nem mesmo totalmente aberta está.


| Beatriz Sarlo propõe a derrubada dessa porta, para que a história tenha condições de fazer o passado surgir tão amplamente quanto lhe seja possível apresentar-se.

| A autora bonaerense de 63 anos, professora de literatura argentina por duas décadas na Faculdade de Filosofia e Letras da Universidade de Buenos Aires e diretora, desde 1978, da revista de cultura e política “Punto de vista”, conversou com Trópico sobre seu livro.



fonte Revista 'Trópico'; matéria 'Chega de subjetividade' por Denise Mota

6 comentários:

Ela disse...

Gueko arrebentando aqui,hehe!
Bem interessante esse ponto de vista em relação a memória.
ALias,legal colocar esse site aqui,para podermos pensar o que ela:
http://www.museudapessoa.net/
beijos.

Ela disse...

o que ela diz!
faltou

gueko /// disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
gueko /// disse...

olá moça
obrigado pela visita, pelo elogio e pela sugestão
infelizmente ñ encontrei conteúdo relacionado a beatriz sarlo no 'museu da pessoa' pois gostaria de incluí-lo ao post

abraços

Dally Schwarz disse...

nao,entao,nao tem conteudo relacionado a ela nao!
Mas eu quis linkar com a ideia da memoria pessoal na construção da historia.
hehehe!
beijocas

gueko /// disse...

devo andar muito cansado mesmo para ñ perceber tão boa relação!

mas enfim...
obrigado mesmo moça
sua sugestão virou post agora